Principais dúvidas sobre a aplicação de sanções disciplinares no contrato de trabalho

O contrato de trabalho é de natureza subordinada, ficando o empregado sujeito ao poder diretivo, regulamentar, fiscalizatório e disciplinar do empregador. Neste diapasão, o empregador deve dirigir a prestação de serviços, fiscalizar o cumprimento da efetiva e regular atuação dos seus empregados e, em caso de descumprimento de suas obrigações, aplicar-lhes as sanções disciplinares correspondentes.

 

Em relação às espécies de sanções disciplinares, é importante ressaltar que a legislação trabalhista nacional admite a aplicação de advertência, verbal ou escrita, suspensão de até 30 (trinta) dias e despedida por justa causa.

 

Para aplicação de qualquer delas é indispensável “ater-se ao nexo de causalidade entre a falta e a punição e à imediatidade, sob pena de perdão tácito; a proporcionalidade entre o comportamento faltoso e a sanção; a proibição de dupla penalidade pela mesma falta – non bis in idem; a aplicação de sanções iguais aos empregados que praticam a mesma falta”. (BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006, p.848-850).

 

A experiência prática demonstra que diversas dúvidas surgem na aplicação das sanções disciplinares pelos empregadores, razão pela qual separamos os principais questionamentos acerca do tema, a fim de traçar uma espécie de guia para auxiliar no desempenho do poder disciplinar inerente às relações de emprego:

 

  1. Há necessidade de gradação das penas? Em outras palavras, para a aplicação da justa causa, faz-se necessária a prévia aplicação de advertência(s) e, depois, de suspensão(ões)?

 

Não. O que deve ser observado pelo empregador no momento da aplicação de uma sanção disciplinar é o histórico do empregado, a natureza e a gravidade da falta disciplinar, os danos que dela provierem para a empresa e, principalmente, as circunstâncias em que a falta foi cometida, que podem agravar ou atenuar a penalidade. O mais importante é que a sanção seja proporcional à falta aplicada. Um pequeno erro cometido pelo empregado, por exemplo, deve ser punido com uma advertência, já que não traz maiores prejuízos à atividade empresarial. Já um ato de improbidade, que viole as normas de compliance e atente contra a honra da pessoa jurídica, deve ser imediatamente punida com a justa causa. É recomendável que o Jurídico da empresa sempre seja consultado antes da aplicação de uma sanção disciplinar, a fim de evitar eventuais questionamentos por parte dos empregados e, por conseguinte, indesejáveis passivos trabalhistas.

 

  1. Existem causas específicas para caracterizar a justa causa?

 

Sim. No Brasil, o elenco de condutas que ensejam a despedida por justa causa é taxativo e previsto legalmente, mais especificamente no art. 482 da CLT (existem outras hipóteses específicas, mas que fogem ao escopo desse trabalho), a seguir transcrito:

 

Art. 482 – Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

  1. a) ato de improbidade;
  2. b) incontinência de conduta ou mau procedimento;
  3. c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
  4. d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;
  5. e) desídia no desempenho das respectivas funções;
  6. f) embriaguez habitual ou em serviço;
  7. g) violação de segredo da empresa;
  8. h) ato de indisciplina ou de insubordinação;
  9. i) abandono de emprego;
  10. j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
  11. k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
  12. l) prática constante de jogos de azar.
  13. m) perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado. (Incluído pela Reforma Trabalhista)

Parágrafo único – Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional.

 

A justa causa, portanto, é decorrente de infração do empregado, prevista em lei, que acaba por gerar uma grave quebra da fidúcia inerente ao pacto laboral. Sem tal confiança, resta impossibilitada a continuidade do contrato de trabalho, uma vez que o ato faltoso cometido pelo empregado termina por acarretar no empregador tamanha desconfiança que impede a continuidade da prestação de serviços.

 

  1. A reiteração de condutas faltosas de menor gravidade pode ensejar uma despedida por justa causa?

 

Sim. Faltas de menor gravidade, já punidas com advertências e suspensões, podem ensejar aplicação da justa causa pelo empregador, uma vez que revelam atos de indisciplina, insubordinação e desídia, condutas previstas no art. 482 da CLT. Um empregado, por exemplo, que costuma se ausentar do posto de trabalho durante a sua jornada, já tendo sido punido com advertências e suspensões, pode, sim, ser dispensado por justa causa. É importante salientar, entretanto, que o ônus da prova da resolução contratual por justa causa é do empregador, que deve se munir de todas as provas das infrações praticadas pelo obreiro.

 

  1. Quais os cuidados que devem ser tomados na aplicação das sanções disciplinares?

 

As sanções disciplinares devem ser aplicadas sempre de forma cautelosa e mais reservada possível, evitando qualquer tipo de constrangimento indevido ao empregado. Assim, não deve o empregador dar qualquer tipo de divulgação nominal das sanções aplicadas a um empregado. Caso não haja, na empresa, um procedimento formal de aplicação de punições disciplinares que contenha a forma e a competência para tal ato, recomenda-se que a sanção seja aplicada pelo superior hierárquico imediato do empregado, com a participação de algum outro empregado designado pelo setor de Gestão de Pessoas/RH. Caso o empregado se recuse a assinar, devem ser convocadas, também de forma sigilosa, duas testemunhas para presenciar o ato.

 

  1. Um empregado pode ser punido duas vezes pela mesma falta? Além disso, há um prazo para a aplicação de uma punição disciplinar?

 

Não pode haver dupla punição para uma mesma infração disciplinar. Assim, ao aplicar uma sanção, a empresa deve sopesar os critérios já explicitados acima e punir de uma só vez o empregado pela falta praticada. Caso haja, entretanto, reiteração da falta, outra sanção poderá ser aplicada. Em relação ao prazo, não há previsão na lei de um prazo para a punição do ato faltoso. Contudo, a punição tem de ser atual. Se o empregador deixar transcorrer tempo indevido entre a falta e a sanção, ocorrerá o perdão tácito, não podendo mais aplicar a punição. Desse modo, logo que tomar conhecimento da falta, deve o empregador efetuar a punição. Como bem salienta VÓLIA BOMFIM (Direito do Trabalho. 15ª ed. Rio de Janeiro: Forense, p. 1069), “a rapidez da punição deve ser avaliada de acordo com cada tipo de empregador e a complexidade burocrática que cada empresa exige para processar uma dispensa por justa causa”. Assim, deve ser observado um prazo razoável para a aplicação da sanção, sob pena de se perder a possibilidade de aplica-la.

 

 

*por Lucas Costa Moreira (OAB/BA 31.274)

 

Leave A Comment